Em ‘Saúde como uma ação criativa de enfrentamento da vida: a experiência de pessoas que abusam de álcool e outras drogas’, capítulo do livro ‘Olhares e Perspectivas da Terapia Ocupacional: construindo teorias e pensando a prática’ publicado pela Editora UFPB, Carolina Couto e Vanessa Barros (2021) discutem o processo de saúde-doença a partir da perspectiva de Canguilhem (2012). A baixo alguns trechos do texto:
Canguilhem “defendeu que o normal e o patológico são fenômenos qualitativamente diferentes, que atingem todo o organismo devido à integralidade de seus processos e de suas funções. Baseando-se no conceito de “norma”, esse autor afirma uma polaridade dinâmica entre a saúde e a doença. As normas, ou seja, o que é considerado normal e anormal, mudam ao longo do tempo devido à capacidade humana de inventar novos instrumentos para dominar os meios para viver. Lutar contra os obstáculos à própria manutenção do sujeito é um movimento espontâneo da vida, para manter-se e desenvolver-se.”
“Afirma-se a saúde como um ato criativo – criador de valores – e instaurador de normas vitais. Por poder transformar o contexto em que se encontra, o sujeito atribui à vida outras propriedades e exercita sua capacidade de transgredir ao ultrapassar as normas, criar outras e valorar seu comportamento. Nesse sentido, afirma o humano como um ser livre, criativo e normativo.”
“Para que a atividade normativa seja possível, é preciso que a vida seja para o sujeito uma experiência, aberta à novidade e ao rearranjo de seus contornos. Como nos ensina Larrosa (2015), a experiência é aquilo que nos acontece, nos toca, nos afeta e o modo como lhe atribuímos ou não um sentido. Fazer uma experiência é deixar-se aberto, receptivo, exposto àquilo que nos interpelar, pois “aquilo de que [o sujeito] faz experiência dele se apodera” (LARROSA, 2015.p.28). Seria precisamente, então, deixar-se envolver pela vida.”
“A vida, como a experiência, é relação: com o mundo, com a linguagem, com o pensamento, com os outros, com nós mesmos, com o que se diz e o que se pensa, com o que dizemos e o que pensamos, com o que somos e o que fazemos, com o que já estamos deixando de ser.”
Ainda na perspectiva desta autor, o patológico, por sua vez, “implicaria pathos, sentimento direto e concreto de sofrimento e de impotência, de vida contrariada (CANGUILHEM, 2012, p.89) (…) A doença teria um caráter conservador, e a saúde um caráter de abertura ao novo. Ou seja, estando sob outras condições de vida, o doente estaria limitado na sua capacidade de poder instituir normas diferentes, na sua capacidade normativa. Podemos associar a doença a uma ‘experiência enjaulada’ (LARROSA, 2015) por uma lógica, por saberes e práticas que já não respondem mais às necessidades do sujeito. Nessa situação reduzida, o sujeito não sente a vida acontecer. A sensação é de irrealidade, e, mesmo que ainda o sujeito esteja andando, sua vida sucumbe.”
“O real está relacionado com a vida e a irrealidade com a desvitalização da vida, o sentimento que nos faz dizer que essa vida não é vida” (LARROSA, 2015, p.108). Nessa jaula, sob uma norma diferente, insatisfatória para o sujeito, a experiência é a da doença.”
Carolina Couto e Vanessa Barros trazem uma perspectiva bastante interessante do processo saúde-doença, em que uma não exclui a outra, mas a considera no movimento da vida de expansão e contração.
O que dialoga com a proposta Chamoneana, que compreende saúde como a capacidade de ser ativo no mundo; criador que observa, apreende e critica o que faz, descobrindo limites e possibilidades, desejos e necessidades, problemas e soluções … o contrário, o adoecimento, é a vivência da alienação, o não reconhecimento naquilo que se faz, a apatia, a perda de sentido da vida.
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OBS.: O livro completo você pode baixar no site da Editora UFPB.